sexta-feira, 3 de junho de 2011

Cada um tem um mundo dentro de si

Ultimamente tem sido difícil manter as publicações do blog constantes, como vocês já devem ter percebido. O temido final de semestre se aproxima, as tarefas da faculdade se acumulam, o tempo é escasso e, além disso, fora da vida acadêmica, algumas responsabilidades também aumentam. Há alguns meses, comecei a corrigir redações de alunos  para um colégio da cidade. Apesar do tempo necessário que se leva para realizar um bom trabalho, essa nova atividade tem valido a pena. Não, não tenho um retorno financeiro invejável. Apesar de ser uma fonte de renda, essa não é a principal razão para que o fato de eu corrigir redações me seja agradável.

Ao ler essas páginas, tenho acesso às informações do que se passa na mente desses jovens, dos seus sentimentos, das suas histórias, dos seus diversos modos de enxergar o mundo e a vida. Não são simples dados, sem significância. Também não passo a caneta vermelha riscando qualquer coisa em um papel. Apesar de serem simples manifestações da escrita em idade escolar, esses textos revelam os sistemas de valores de seus autores e, ao ler esse conjunto variado, tenho uma certa noção da alma e da mentalidade desses indivíduos em formação. Quando digo alma, não me refiro ao seu estado de graça ou não, mas às inclinações e às peculiaridades que são próprias a cada personalidade.

É muito curioso notar as semelhanças e as diferenças entre os textos. O formato da letra, a pressão da tinta no papel, a escolha das palavras, os modos de organizar os diversos elementos da sentença e o conteúdo dos textos formam uma combinação única a cada aluno, mas que às vezes se mescla com a de outro colega. As letras mais bonitas geralmente são de meninas, assim como os textos mais bem articulados. Mas há, de vez em quando, alguns meninos que fogem à regra e, quando surpreendem, o fazem  a valer.

Um tema sobre o qual eles escreveram, e que foi muito interessante ler os resultados, foi a descrição de uma cena que tenha sido importante na vida deles. Esse tema mostrou-me o quão distorcidos estão os valores da sociedade e como eles já estão se cristalizando na mente dos jovens, sendo considerados normais. Além disso, o desconhecimento da verdadeira religião, e até mesmo a aversão a qualquer uma delas, deixam suas marcas nas redações que li. Uma delas, foi a de um garoto, contando que ficou surpreso ao ver duas moças se beijando na boca perto da escola. Mas, depois de refletir um pouco, concluiu que elas eram muito corajosas por enfrentarem o "preconceito" e que não havia nenhum problema naquela atitude, pois elas deviam se gostar de verdade.

Outra redação, de uma menina, contava a tristeza que sentiu quando os pais lhe contaram que iriam se separar. Mas que hoje, ela vê que isso foi o melhor e está feliz, pois a nova "esposa" do pai está grávida e o "namorado" da sua mãe é muito bonzinho com as duas. Havia também uma, de outra garota, que contava como foi importante seu primeiro "namorado" quando ela tinha 14 anos...

Apesar dessas histórias tristes, li também algumas alentadoras, que são verdadeiras sementes de esperança nesse deserto que é o mundo. Numa delas, um menino contava feliz do nascimento da irmãzinha e dos detalhes desse dia especial que o marcou tanto. Outro, falou das férias que passava no sítio dos avós durante a infância. Contou minuciosamente dos detalhes da casa, do cuidado da avó com a comida, o cheiro de café, as pescarias com o avô num lago próximo. Aliás, muitas foram as redações que falavam sobre os avós. Uns, já falecidos, com uma narrativa repleta de saudades, outros ainda vivos, mas doentes ou enfrentando a viuvez. 

Uma redação que se destacou foi a de um garoto contando os últimos meses de sua madrinha, que falecera devido a um câncer. Foi lindo o relato das lembranças dele com ela e ficou muito clara a importância desse laço sacramental que une padrinhos e afilhados. E, em contrapartida ao rapaz que escrevera elogiando a coragem das moças que se beijavam, um outro menino, que aliás escrevia muito melhor que o primeiro, relatou, inconformado, o momento chocante em que viu duas mulheres trocando beijos imorais no metrô com a maior naturalidade.

Cada um tem um mundo dentro de si que o revela quando escreve. Quando corrijo essas redações, deparo-me com um pedacinho de cada uma dessas almas e, mesmo que nem sempre o que descobrimos seja ordenado e virtuoso, é maravilhoso mergulhar nessas ideias, histórias e sentimentos. Afinal, depois de quase ter perdido a esperança e de ter ficado com o coração apertado ao ver almas tão jovens defendendo o erro, aparece uma que vai na direção contrária e nos conforta, nos enche de esperança. Uma verdadeira consolação de Nosso Senhor.

Um comentário:

  1. Verdadeiramente, penso a mesma coisa!
    Quando corrijo as redações me deparo com situações bem parecidas com as suas - embora ninguém ainda tenha exaltado "a coragem de um casal homossexual".
    Como corrijo sempre das mesmas pessoas, é interessante perceber bem a "confusão interior" que há nos dias de hoje: defendem os valores morais "no geral", mas quando se trata de colocá-los em prática... alguns poucos se salvam.
    Mas o que é impagável é vê-los falando com "autoridade" contra a mídia... defendendo os valores dela.

    Besitos!

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